domingo, 4 de setembro de 2011

O Casamento e a Terapia de Casal de Orientação Psicanalítica

O Texto abaixo faz parte da monografia de pós-graduação em Terapia de Família :


ABORDAGEM PSICANALÍTICA DA GÊNESE DO APARELHO MENTAL, DAS FANTASIAS E DA FORMAÇÃO E ESTRUTURAÇÃO DOS VÍNCULOS NA TERAPIA DE CASAL


Todos esperam serem felizes no casamento. Quando apaixonados todos os olhos estão voltados para a pessoa amada. Não é à toa que todos os contos infantis terminam com o encontro daquela que tanto sofreu com o príncipe encantado e finalizam com "e foram felizes para sempre". Como se houvesse um grande desejo de parar o tempo. Por parte das mulheres, a vontade de ser protegida e ter filhos são um exercício desde menina. Quando cresce aspira também a ser protegida pelo marido. Para os moços, a expectativa é de ser acolhido num ninho de compreensão e amor. Ela acredita poder realizar todos os sonhos levantados nas brincadeiras de casinha, e isto é normalmente reforçado pelos homens que acabam sendo formados para dar conta de tudo, e quando isso não ocorre, se vêem desprestigiados. Com isto ocorre aqui um grande choque entre sonhos e realidade. Os ideais muitas vezes acabam atrapalhando o entendimento do casal. 

Ter que lidar com o fato de serem duas pessoas diferentes sempre é problemático. Quando se está apaixonado, o outro é o bem total, e o eu nem é merecedor de tanta perfeição.  Esse sentimento vem de quando o bebê está com fome e esperneia pelos cuidados e vem a mãe ou sua substituta atendê-lo aliviando a fome e o desespero; isto deixa uma sensação de grande prazer e gratidão para com a mãe, até a próxima mamada, quando tudo vai se repetir.

É importante reconhecer as diferenças entre os componentes do casal. A diversidade é trabalhosa, mas é muito mais estimulante. Uma mulher que tem suas experiências profissionais, seus relacionamentos de amizade, suas idéias, tem muito mais a contribuir no casamento do que aquela que só tem olhos para o marido. Quem dá muito, cobra muito. Um homem que vibra com as próprias coisas e uma mulher que têm várias fontes de satisfação têm mais condições de tornar seu casamento criativo. Porque diferentes são todos. Todos sedentos de amor. Numa situação na qual o amor é tão fundamental, a vida fica insatisfatória e pobre. Insatisfatória porque a bem aventurança da paixão é passageira.


Estados de amor no adulto são necessariamente alternados com insatisfação. A única situação de absoluta dependência do outro que faz bem é aquela do bebê com sua mãe. Não é bom para aquele que depende, nem para aquele que é o objeto da eleição. Se um dos cônjuges tem como único projeto estar colado ao seu parceiro, está perdido, porque, mais cedo ou mais tarde vai se dar conta de que são dois e não um só. Se forem iguais é porque um está tendo que abrir mão do que pensa, da própria personalidade. No fundo fazem isso para evitar atritos, acreditam que as discussões desgastam a relação. Isto é péssimo para qualquer relacionamento. Estes casamentos estão apoiados em doutrinas: dá para falar, não dá para falar.

Construir um relacionamento fundamentado na liberdade e não no apego e possessão é essencial para o fortalecimento do casal. Saber disso é a base para uma relação de crescimento.

Envolvidos pela magia do enamoramento, muitas pessoas acabam esbarrando no que Freud denominou "amor narcisista". Facilmente o ser humano cai na armadilha do "amor como reprodução".  Este fenômeno é provocado pela projeção de um indivíduo no outro. É amar no outro a própria imagem, ou as características que gostaria de ter.

Este comportamento diminui as chances da pessoa permanecer no estado amoroso, pois mais dia, menos dia, acorda e percebe a ilusão criada por sua própria fantasia. É o instante em que a cortina cai e o outro é visto sem as vendas de quem está tomado pela poção do amor.

Para construir uma relação são necessárias três etapas que devem ser vencidas; cada uma dela exige muitas vezes um trabalho psíquico com o qual os componentes do casal não foram aparelhados nas suas fases primordiais do desenvolvimento humano.

1. Enamoramento - quando o outro é tudo para nós! É uma fase muito útil para casar-se...;
2. Descoberta - quando descobrimos que a outra pessoa não é exatamente aquilo que esperávamos. Esperanças e alegrias coexistem com as decepções e tristezas;
3. Maturidade - quando se descobre o valor do outro como ele é e não como poderia ser. Tolerância e companheirismo

O tempo de duração do estado prazeroso de descoberta, só depende da forma como se vai lidar com os aspectos reais, menos românticos do outro. O mar de rosas do primeiro momento se revela um oceano complexo, cheio de inseguranças, possíveis neuroses e dúvidas.

Se a pessoa não tiver estrutura para aceitar o outro de forma adequada, um afastamento é inevitável; quando o casal consegue manter o respeito à individualidade, estabelecendo um relacionamento de troca, é possível que a magia do encantamento inicial nunca se esgote. Ela se transformará, junto com as mudanças e o aprofundamento da relação.